Trafaria Praia é o projeto de Joana Vasconcelos para a Participação de Portugal na 55ª Exposição Internacional de Arte - la Biennale di Venezia. O projeto analisa a relação histórica entre Portugal e Itália, que se desenvolveu através do comércio, da diplomacia e da arte. Lisboa e Veneza intersetam-se em diversos pontos; as duas cidades desempenharam papéis fundamentais na expansão da visão do mundo europeia durante a Idade Média e o Renascimento, redefinindo a imago mundi através do estabelecimento de redes entre o Ocidente e o Oriente.
Trafaria Praia aborda a zona de contacto existente entre Lisboa e Veneza na contemporaneidade através de uma reflexão acerca de três aspetos fundamentais que as cidades partilham: a água, a navegação e o navio.
Vasconcelos propõe uma correspondência alegórica entre o cacilheiro, o icónico ferryboat de Lisboa, e o pitoresco vaporetto de Veneza. Os cacilheiros cruzam, diariamente, o rio Tejo, levando passageiros da Margem Sul a Lisboa e vice-versa. Os seus utilizadores regulares são habitantes da Margem Sul que trabalham em Lisboa. Até à edificação da primeira ponte entre Lisboa e a Margem Sul, em 1966, estes navios eram o único meio de transporte público entre a cidade e aquela região. Daí que os cacilheiros se associem, desde sempre, ao operariado e à classe média e sejam um conhecido símbolo social, com conotações políticas, em Portugal.
Vasconcelos levou um cacilheiro, o Trafaria Praia, para Veneza, onde o apresenta como pavilhão português. O Trafaria Praia pertence à Transtejo, que o desativou em 2011. Nos últimos seis meses, o navio sofreu transformações significativas no estaleiro Navaltagus, situado no Seixal. Em Veneza, o Trafaria Praia atraca junto à paragem de vaporetto dos Giardini e circula pela lagoa, de acordo com um horário pré-determinado, durante a Bienal de Veneza. Assim, em vez de um convencional pavilhão com uma localização fixa, Vasconcelos cria um idealista pavilhão flutuante. A artista desterritorializa o território, pois, metaforicamente ultrapassando as lutas de poder que tão frequentemente marcam as relações internacionais.
Vasconcelos também apresenta o Trafaria Praia como arte. Seguindo a lógica do readymade assistido, inaugurada por Marcel Duchamp, a artista mudou o objeto sem o desfuncionalizar. No exterior do navio, da proa à popa, a artista aplica um painel de azulejos de grande escala em azul e branco, pintado à mão, que reproduz uma vista contemporânea de Lisboa, da Torre do Bugio à Torre Vasco da Gama. A obra inspira-se num outro painel de azulejos de grande escala, o Grande Panorama de Lisboa, que mostra Lisboa antes do sismo de 1755, e é uma expressão fundamental do estilo barroco da era dourada da produção azulejística em Portugal. Tal como em obras anteriores, a artista reveste um objeto com azulejos, assim convocando a dimensão arquitetural da azulejaria.
No convés do Trafaria Praia, Vasconcelos elabora um ambiente à base de têxteis e luz. Tal também ecoa obras anteriores, tais como Contaminação (2008-10) e a série "Valquírias" (em curso desde 2004). Estas obras consistem em formas orgânicas, geralmente coloridas e normalmente suspensas do teto, que interagem com as estruturas arquitetónicas circundantes. A nova obra é um complexo patchwork azul e branco que cobre o teto e as paredes, de onde emerge um emaranhado de peças crochetadas que incorporam LED. A instalação sugere uma atmosfera uterina, de tendência surreal, que remete para o fundo do mar - um cenário talvez evocativo do livro Vinte Mil Léguas Submarinas, de Jules Verne, ou alusivo à narrativa bíblica de Jonas e a Baleia. A obra envolve os visitantes, assim suscitando uma experiência tanto intelectual como sensorial.
MATERIAIS: Navio-motor de passageiros de 1960 em aço, revestimento e mobiliário em cortiça
DIMENSÕES: 1430 x 750 x 3010 cm
MATERIAIS: Azulejos Viúva Lamego pintados à mão sobre painel compósito
DIMENSÕES: 220 x 6000 cm
MATERIAIS: Croché em lã feito à mão, aplicações em feltro, tecidos, adereços, poliéster, LEDs, sistema elétrico
DIMENSÕES: Dimensões variáveis
Obras